27 de abril de 2008

A participação da Ciência na Sociedade...

Hoje em dia a ciência assume um papel, cada vez mais importante, no quotidiano do cidadão comum, apesar dos modos diferenciados como cada um de nós interage com os conceitos científicos ou, de forma mais pertinente, com os argumentos científicos.
É hoje, fundamental, compreender a forma como os argumentos científicos são mobilizados em controvérsias públicas, a par de outros argumentos, desde o foro político ou económico ao foro ético ou religioso, ou ainda, reconhecer que a ciência tem as suas próprias limitações aquando a tomada de decisões em questões públicas polémicas. Só com um mínimo de domínio do conhecimento científico o cidadão poderá cumprir o seu papel cívico - a participação consciente nas grandes questões.
Foi com o propósito desta consciencialização que se propôs a votação, na forma de referendo, a duas questões, uma que ainda assombra a nossa memória, e outra, cujos avanços na área não permitem que saia da ordem do dia:

Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?

Concorda com a obtenção, utilização e manipulação de células estaminais, obtidas a partir de embriões humanos, por procedimentos que impliquem a sua destruição até 14 dias após a sua fertilização, para investigação em aplicações futuras no tratamento de doenças, designadamente as patologias do tipo degenerativo e as que resultam da aniquilação irreversível de tecidos e parte de órgãos?
Os resultados destes dois escrutínios, referentes a um total de dezassete eleitores, estão sintetizados nos dois gráficos respectivos que a seguir se apresentam:

20 de abril de 2008

A clonagem humana ao virar da esquina?

A clonagem terapêutica tem levantado questões éticas e suscitado críticas da sociedade civil e das autoridades política e religiosas. Consiste em clonar um embrião humano nos seus primeiros estádios para ali colher células estaminais embrionárias (CEE), consideradas o Graal da medicina do futuro.
Só que exige a destruição do embrião. Por isso, quando, em 2007, várias equipas confirmaram o trabalho de uma equipa japonesa, demonstrando um método de geração de CEE sem embriões, até o presidente Bush e o Vaticano louvaram o avanço. Mas num artigo ontem publicado pelo diário britânico The Independent, Robert Lanza, da empresa Advanced Cell Technologies e o pioneiro da investigação na área, afirma que essa técnica poderá ter tornado mais fácil a clonagem de seres humanos.
As CEE humanas dão origem a todos os tecidos do corpo. E, quando for possível cultivá-las, deverão permitir personalizar a medicina como nunca. Partindo das células de um doente com Parkinson ou Alzheimer, será possível produzir linhagens de CEE e a seguir transformá-las em neurónios para esses doentes. Daí os esforços que têm sido feitos para obter CEE humanas sem recorrer embriões. E sabe-se hoje que é possível, simplesmente, “reprogramar”, geneticamente uma célula adulta – da pele, por exemplo – para que ela “regresse ao passado” e torne ser uma célula primordial. A possibilidade de criar estas “células estaminais pluripotentes induzidas” – ou células iPS – foi demonstrada no ratinho e, mais recentemente, no ser humano.
(…)

In PÚBLICO

Apesar de as CEE constituírem o Graal da medicina do futuro, a sua investigação ou aplicação levanta imensas questões de ordem ética, moral ou social que não podem ser ignoradas. Mas, será legítimo que esta busca por um potencial bem comum prevaleça e se sobreponha à consciência ética de cada um?

7 de abril de 2008

A ciência e as fronteiras da vida

No dia 11 de Fevereiro de 2007, foi colocada em referendo aos portugueses a seguinte pergunta:
Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?


O debate foi vivo e foram esgrimidos “argumentos científicos” a favor e contra. Mas o que é exactamente um “argumento científico”? Será um argumento científico suficiente para suportar uma tomada de decisão com consequências éticas?
“Poucos problemas éticos são hoje objecto de uma luta tão acesa como o aborto e, embora o pêndulo tenha oscilado para ambos os lados, nenhum deles teve grande êxito em modificar a opinião dos seus oponentes. (…)
O aborto e as experiências destrutivas com embriões levantam questões éticas diferentes porque o desenvolvimento do ser humano é um processo gradual. Se tomarmos um óvulo fertilizado imediatamente após a sua concepção, é difícil ficar perturbado com a sua morte. O óvulo fertilizado é uma única célula. Vários dias depois não passa ainda de um minúsculo aglomerado de células sem nenhuma característica anatómica do ser em que se virá a transformar. As células que virão a formar o embrião são nesta fase indistinguíveis das que irão formar a placenta e o líquido amniótico. Até cerca de 14 dias após a fertilização não se pode sequer saber se o embrião irá dar origem a um ou dois indivíduos (…). Aos 14 dias surge a primeira característica anatómica, a chamada linha primitiva, na posição em que mais tarde se desenvolverá a coluna vertebral. Neste momento, o embrião não pode ter consciência nem sentir dor. No outro extremo situa-se o ser humano adulto. Matar um ser humano é assassínio (…). Contudo, não existe uma linha divisória nítida que separe o ovo fertilizado do adulto.”

Peter Singer – “Ética Prática”


Ou será que existe? O que nos pode dizer a ciência sobre isto? Qual a validade de algumas fronteiras tradicionais (nascimento, viabilidade extra-uterina, primeiros movimentos, consciência)? Qual o significado científico do limite das 10 semanas? O que torna um argumento “científico”? A “pílula do dia seguinte” é um método abortivo?